Em nossa rotina diária, costumamos idealizar diversos planejamentos. Férias, orçamentos, viagens, horários, compromissos, reuniões, compras, dentre muitos outros, mas dificilmente planejamos a sucessão, pois a morte é tida como assunto delicado.
A morte consiste no fim de um ciclo e sua ocorrência é inevitável. Na humanidade, nada é eterno, duradouro ou definitivo, como poetisa Arnaldo Rizzardo. A única certeza é que todos morreremos, sendo impossível prever o momento exato.
A abertura da sucessão decorre da morte; nesse momento, os herdeiros se tornam partes com interesses concretos e, muitas vezes, conflitantes.
A sucessão, isto é, a transmissão de direitos, pode ser inter vivos (em vida) ou causa mortis (após a morte).
O patrimônio adquirido durante toda uma vida pode ser transmitido aos sucessores dessa pessoa, limitando-se ao quinhão partilhado que cabe a cada herdeiro.
Dependendo da quantidade de bens e havendo pluralidade de herdeiros, dificilmente as partes conseguirão conciliar seus interesses. Inclusive, é exatamente esse o momento de maior discórdia familiar e de entrave no processo sucessório.
Assim, o processo de inventário, com discordância, pode culminar em um litígio que se arrasta por anos, em razão da falta de acordo entre herdeiros. Estima-se, no Brasil, que o processo de inventário pode durar, em média, 15 anos. Em razão disso, a utilização do patrimônio pode tornar-se inviável ou nociva. A demora impede a fruição do patrimônio, bem como acarreta a inevitável perda de oportunidades de negócios.
No cenário das empresas familiares, especialmente quando o falecido estava à frente dos negócios, a ausência de planejamento, muitas vezes pelo simples dissenso quanto à divisão patrimonial, pode tornar-se prejudicial e impactar negativamente as atividades, o desenvolvimento e a gestão de negócios das empresas.
Sobre as particularidades das empresas familiares, o ilustre Prof. Osmar Brina Corrêa Lima cita[1]:
À medida que o “patriarca” vai envelhecendo, costuma esboçar-se [certa] insatisfação latente, decorrente, em parte, do conflito de valores que inspiram diferentes gerações. Esse conflito, percebido e sentido de maneira difusa, permanece abafado, não claramente explicitado, dividindo as pessoas da família em grupos antagônicos e veladamente hostis. Esse conflito vai minando, aos poucos, as bases da [a]ffectio societatis. Quando o patriarca finalmente se afasta ou morre, o conflito se explicita em disputa de poder ou em litígios sucessórios.
Em um processo de inventário o litígio, diante do fato concreto, obrigará o magistrado a proferir decisões não tão satisfatórias para todos os herdeiros. Pequenas divergências ou decisões conflitantes podem motivar uma nefasta relação familiar.
Há constante preocupação quanto à continuidade das empresas familiares. As estatísticas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) apontam que 30% das empresas familiares chegam à segunda geração e apenas 5% conseguem alcançar a terceira geração.
Para evitar traumas familiares, a solução é planejar a sucessão. O planejamento sucessório tende a ser mais econômico, ágil, eficaz e cordial, além de garantir a perpetuação dos negócios familiares.
Disso decorre a necessidade de elaborar instrumentos jurídicos para preservar, sem conflitos, as empresas familiares e a transmissão sucessória de sua propriedade.
Mesmo considerando os limites do Direito de Família, como regimes de casamento, herança legítima, sociedade entre cônjuges e garantias de subsistência ao doador, existem na legislação pátria diversas alternativas para o ato de planejar a sucessão.
Segundo Silvia Maria Benedetti Teixeira, a finalidade do planejamento sucessório é determinar a sucessão como atividade “preventiva com o objetivo de adotar procedimentos, ainda em vida do titular da herança, com relação ao destino de bens após a sua morte”[2].
Ensina a doutrina de Cláudia Viegas e Gabrielle Bonfim:
A sucessão empresarial não é um assunto simplório [sobretudo] quando uma sociedade familiar está em foco. Planejar a sucessão é lidar com uma gama abrangente de feições, sejam es[t]as estratégicas, societárias, tributárias, de gestão, comportamentais e emocionais (artigo publicado na Revista de Direito Empresarial).[3]
Nesse contexto, há diversos instrumentos jurídicos para implementar um planejamento sucessório sem traumas. Dentre eles destacamos a holdingfamiliar.
Holding (termo em inglês derivado do verbo hold – “segurar”), significa “controle”, “participação”. Não se trata de tipo societário, mas se refere ao objeto, à atividade da sociedade.
A sociedade do tipo holding também participa ou detém participações societárias em outras sociedades – ainda que não especificadas no estatuto (como prevê a Lei n. 6.404/1976).
Atualmente, mostra-se indispensável estimular a transparência e a profissionalização da família nas tomadas de decisões de empresas familiares, estimulando a governança corporativa em sociedades empresariais.
Assim, a criação de uma holding para deter e gerir participações societárias proporciona equilíbrio para a elaboração de estratégias entre as sociedades dos grupos. Uma holding tende a evitar conflitos entre sócios, pois os dissensos ficam restritos a ela, que também constitui uma ferramenta integradora entre as gerações familiares.
Ademais, vale considerar que a holding não é um pacto sucessório, ou seja, disposição de herança futura, como determina o art. 426 do Código Civil de 2002. A constituição da holding familiar visa a assegurar a sucessão e sua criação, o que não exclui a utilização de outros instrumentos jurídicos.
Sabe-se que não há fórmula para a implementação do planejamento sucessório. É necessário analisar e ponderar os instrumentos mais adequados à situação, levando em consideração as medidas estratégicas, societárias, tributárias e de gestão de cada grupo familiar.
A estruturação dos negócios via holding familiar é, portanto, uma alternativa para o planejamento sucessório que busca evitar conflitos familiares e garantir uma gestão de patrimônio eficaz. Ela facilita a transição entre gerações e possibilita a colação de ganhos econômicos financeiros, a perpetuação do patrimônio e a manutenção dos laços familiares.
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[1] Corrêa-Lima. Osmar Brina. Sociedade Anônima. 3 edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.p.425.
[2] TEIXEIRA, Silvia Maria Benedetti. Planejamento Sucessório: uma questão de reflexão. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: Síntese, ano VIII, n. 31, p. 5-18, ago./set. 2005
[3] Viegas, Cláudia Maria de Almeida Rabelo; Bonfim, Gabrielle Cristina Menezes Ferreira. Governança Corporativa nas empresas familiares: profissionalização da administração e viabilidade na implantação de planos jurídicos- sucessórios eficientes. Revista de Direito Empresarial. Vol. 14. Ano 4. p. 73-91. São Paulo. Ed. RT.mar-abril.2016.
*Edição IGSA
*Fonte de pesquisa: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/holding-familiar-como-instrumento-de-planejamento-sucessorio-25112018
Por: Holding familiar como instrumento de planejamento sucessório, .
Em nossa rotina diária, costumamos idealizar diversos planejamentos. Férias, orçamentos, viagens, horários, compromissos, reuniões, compras, dentre muitos outros, mas dificilmente planejamos a sucessão, pois a morte é tida como assunto delicado.
A morte consiste no fim de um ciclo e sua ocorrência é inevitável. Na humanidade, nada é eterno, duradouro ou definitivo, como poetisa Arnaldo Rizzardo. A única certeza é que todos morreremos, sendo impossível prever o momento exato.
A abertura da sucessão decorre da morte; nesse momento, os herdeiros se tornam partes com interesses concretos e, muitas vezes, conflitantes.
A sucessão, isto é, a transmissão de direitos, pode ser inter vivos (em vida) ou causa mortis (após a morte).
O patrimônio adquirido durante toda uma vida pode ser transmitido aos sucessores dessa pessoa, limitando-se ao quinhão partilhado que cabe a cada herdeiro.
Dependendo da quantidade de bens e havendo pluralidade de herdeiros, dificilmente as partes conseguirão conciliar seus interesses. Inclusive, é exatamente esse o momento de maior discórdia familiar e de entrave no processo sucessório.
Assim, o processo de inventário, com discordância, pode culminar em um litígio que se arrasta por anos, em razão da falta de acordo entre herdeiros. Estima-se, no Brasil, que o processo de inventário pode durar, em média, 15 anos. Em razão disso, a utilização do patrimônio pode tornar-se inviável ou nociva. A demora impede a fruição do patrimônio, bem como acarreta a inevitável perda de oportunidades de negócios.
No cenário das empresas familiares, especialmente quando o falecido estava à frente dos negócios, a ausência de planejamento, muitas vezes pelo simples dissenso quanto à divisão patrimonial, pode tornar-se prejudicial e impactar negativamente as atividades, o desenvolvimento e a gestão de negócios das empresas.
Sobre as particularidades das empresas familiares, o ilustre Prof. Osmar Brina Corrêa Lima cita[1]:
À medida que o “patriarca” vai envelhecendo, costuma esboçar-se [certa] insatisfação latente, decorrente, em parte, do conflito de valores que inspiram diferentes gerações. Esse conflito, percebido e sentido de maneira difusa, permanece abafado, não claramente explicitado, dividindo as pessoas da família em grupos antagônicos e veladamente hostis. Esse conflito vai minando, aos poucos, as bases da [a]ffectio societatis. Quando o patriarca finalmente se afasta ou morre, o conflito se explicita em disputa de poder ou em litígios sucessórios.
Em um processo de inventário o litígio, diante do fato concreto, obrigará o magistrado a proferir decisões não tão satisfatórias para todos os herdeiros. Pequenas divergências ou decisões conflitantes podem motivar uma nefasta relação familiar.
Há constante preocupação quanto à continuidade das empresas familiares. As estatísticas do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) apontam que 30% das empresas familiares chegam à segunda geração e apenas 5% conseguem alcançar a terceira geração.
Para evitar traumas familiares, a solução é planejar a sucessão. O planejamento sucessório tende a ser mais econômico, ágil, eficaz e cordial, além de garantir a perpetuação dos negócios familiares.
Disso decorre a necessidade de elaborar instrumentos jurídicos para preservar, sem conflitos, as empresas familiares e a transmissão sucessória de sua propriedade.
Mesmo considerando os limites do Direito de Família, como regimes de casamento, herança legítima, sociedade entre cônjuges e garantias de subsistência ao doador, existem na legislação pátria diversas alternativas para o ato de planejar a sucessão.
Segundo Silvia Maria Benedetti Teixeira, a finalidade do planejamento sucessório é determinar a sucessão como atividade “preventiva com o objetivo de adotar procedimentos, ainda em vida do titular da herança, com relação ao destino de bens após a sua morte”[2].
Ensina a doutrina de Cláudia Viegas e Gabrielle Bonfim:
A sucessão empresarial não é um assunto simplório [sobretudo] quando uma sociedade familiar está em foco. Planejar a sucessão é lidar com uma gama abrangente de feições, sejam es[t]as estratégicas, societárias, tributárias, de gestão, comportamentais e emocionais (artigo publicado na Revista de Direito Empresarial).[3]
Nesse contexto, há diversos instrumentos jurídicos para implementar um planejamento sucessório sem traumas. Dentre eles destacamos a holdingfamiliar.
Holding (termo em inglês derivado do verbo hold – “segurar”), significa “controle”, “participação”. Não se trata de tipo societário, mas se refere ao objeto, à atividade da sociedade.
A sociedade do tipo holding também participa ou detém participações societárias em outras sociedades – ainda que não especificadas no estatuto (como prevê a Lei n. 6.404/1976).
Atualmente, mostra-se indispensável estimular a transparência e a profissionalização da família nas tomadas de decisões de empresas familiares, estimulando a governança corporativa em sociedades empresariais.
Assim, a criação de uma holding para deter e gerir participações societárias proporciona equilíbrio para a elaboração de estratégias entre as sociedades dos grupos. Uma holding tende a evitar conflitos entre sócios, pois os dissensos ficam restritos a ela, que também constitui uma ferramenta integradora entre as gerações familiares.
Ademais, vale considerar que a holding não é um pacto sucessório, ou seja, disposição de herança futura, como determina o art. 426 do Código Civil de 2002. A constituição da holding familiar visa a assegurar a sucessão e sua criação, o que não exclui a utilização de outros instrumentos jurídicos.
Sabe-se que não há fórmula para a implementação do planejamento sucessório. É necessário analisar e ponderar os instrumentos mais adequados à situação, levando em consideração as medidas estratégicas, societárias, tributárias e de gestão de cada grupo familiar.
A estruturação dos negócios via holding familiar é, portanto, uma alternativa para o planejamento sucessório que busca evitar conflitos familiares e garantir uma gestão de patrimônio eficaz. Ela facilita a transição entre gerações e possibilita a colação de ganhos econômicos financeiros, a perpetuação do patrimônio e a manutenção dos laços familiares.
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[1] Corrêa-Lima. Osmar Brina. Sociedade Anônima. 3 edição. Belo Horizonte: Del Rey, 2005.p.425.
[2] TEIXEIRA, Silvia Maria Benedetti. Planejamento Sucessório: uma questão de reflexão. Revista Brasileira de Direito de Família. Porto Alegre: Síntese, ano VIII, n. 31, p. 5-18, ago./set. 2005
[3] Viegas, Cláudia Maria de Almeida Rabelo; Bonfim, Gabrielle Cristina Menezes Ferreira. Governança Corporativa nas empresas familiares: profissionalização da administração e viabilidade na implantação de planos jurídicos- sucessórios eficientes. Revista de Direito Empresarial. Vol. 14. Ano 4. p. 73-91. São Paulo. Ed. RT.mar-abril.2016.
*Edição IGSA
*Fonte de pesquisa: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/holding-familiar-como-instrumento-de-planejamento-sucessorio-25112018