O ano de 2018 no Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve espaço para a resolução de um conflitos centenários, como a briga de mais de 123 anos entre a União e a Família Real brasileira pela posse do Palácio Guanabara, e contemporâneos, como a regulamentação da guarda compartilhada de animais de estimação.
Na Corte Especial, houve a decisão que restringiu o foro privilegiado para governadores e conselheiros de tribunais de contas aos casos relativos ao cargo. Com relação aos desembargadores o foro, também por decisão da Corte Especial, permaneceu no STJ.
Em matéria processual, a Corte Especial fez leituras do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15) e pacificou temas que vinham gerando dúvidas. É o caso, por exemplo, do julgamento sobre o agravo em recurso especial que não rebate todos os fundamentos da decisão. Ou da definição sobre a taxatividade mitigada do rol do artigo 1.015 do CPC/15.
Já em matéria criminal, o tribunal mudou sua jurisprudência e passou a considerar que a condenação prévia por porte de drogas para uso pessoal não serve para gerar agravante de reincidência.
Na intersecção da esfera penal com a tributária, o STJ decidiu que é crime não recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) próprio, ainda que declarado.
Em outro julgamento aguardado tanto pela Fazenda e quanto pelos contribuintes, a Corte definiu que o critério da essencialidade e da relevância determina o conceito de insumos para permitir créditos de PIS e Cofins – decisão cujo impacto fiscal é estimado em R$ 50 bilhões.
Leia, a seguir, seleção dos principais julgamentos do STJ em 2018.
Em junho de 2018, a Corte Especial decidiu limitar a prerrogativa de foro para governadores e conselheiros de tribunais de contas aos casos relacionados ao mandato e em função do cargo. Os ministros concluíram pela restrição após decisão do STF que, em maio, restringiu a prerrogativa de foro para deputados e senadores para crimes relacionados ao cargo e durante o mandato.
Com a decisão da Corte Superior, os processos envolvendo governadores ou conselheiros que não tiverem relação com os cargos serão baixados para primeira instância. Só ficarão no tribunal os casos que estiverem em fase de alegações finais, perto de serem concluídos.
A restrição da prerrogativa de foro começou a ser debatida no STJ por meio de uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal Márcio Michel Alves de Oliveira pelo crime de fraude no pagamento por cheque. Como resultado, os autos foram baixados para a primeira instância.
Com relação aos governadores, a questão foi definida na Ação Penal 866, que envolvia o governador da Paraíba Ricardo Coutinho (PSB). No caso, o governador paraibano Ricardo Coutinho é investigado pela suposta prática de 12 crimes de responsabilidade cometidos enquanto era prefeito de João Pessoa, em 2010. Os ministros consideraram que os delitos não têm relação com o exercício do cargo de governador e mandaram o processo para o Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB).
Ao contrário do que aconteceu com os governadores e conselheiros de tribunais de contas, os desembargadores que cometerem crimes comuns e de responsabilidade, mesmo que não tenham sido praticados em razão do cargo, continuarão sendo julgados pelo STJ. A Corte Especial seguiu o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, para quem o foro especial tem por finalidade também resguardar a imparcialidade necessária ao julgamento, uma vez que evita o conflito de interesses entre magistrados vinculados ao mesmo tribunal.
Além dos desembargadores, a decisão contempla todos os crimes cometidos por juízes de segundo grau dos TRFs, TRTs e TREs. De acordo com a Corte Especial, o foro de desembargadores no STJ será aplicado sempre que um desembargador acusado da prática de crime sem relação com o exercício do cargo vier a ser julgado por juiz de primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal que ele.
A manutenção do foro privilegiado foi decidida em uma questão de ordem no julgamento de uma ação penal — APn 878 — envolvendo o desembargador Luís César de Paula Espíndola, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, acusado de lesão corporal contra a mãe e a irmã.
No início da discussão, ainda em agosto de 2018, Gonçalves apontou que “ser julgado por juiz com duvidosa condição de se posicionar de forma imparcial, afinal, violaria a pretensão de realização de justiça criminal de forma isonômica e republicana”.
Em uma guinada jurisprudencial, o STJ passou a considerar em 2018 que a condenação prévia por porte de droga para consumo próprio, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas, não deve constituir causa geradora de reincidência. As decisões vieram tanto da 5ª quanto da 6ª Turma – colegiados que compõem a 3ª Seção.
No Recurso Especial 1.672.654/SP, julgado em agosto pela 6ª Turma, a ministra Maria Thereza de Assis Moura considerou ser “inequivocamente desproporcional” a consideração para fins de reincidência, tendo em vista que a posse, embora seja crime, é punida com medidas de natureza extrapenal.
Para a ministra, “em face dos questionamentos acerca da proporcionalidade do direito penal para o controle do consumo de drogas em prejuízo de outras medidas de natureza extrapenal relacionadas às políticas de redução de danos, eventualmente até mais severas para a contenção do consumo do que aquelas previstas atualmente, o prévio apenamento por porte de droga para consumo próprio, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas, não deve constituir causa geradora de reincidência”.
No Habeas Corpus 453.437/SP, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, “mostra-se desproporcional o delito do artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade”. O caso foi analisado pela 5ª Turma em outubro.
Tendo em vista que a reincidência foi o único fundamento para não aplicar a diminuição da pena no caso que estava sendo julgado, Fonseca aplicou a redutora. É que, para a aplicação da causa de diminuição de pena do artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais: ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa.
Neste que é considerado o julgamento de 2018 na área tributária tanto por representantes da Fazenda quanto dos contribuintes, a 1ª Seção do STJ determinou que, no regime não-cumulativo do PIS e da Cofins, as empresas podem tomar créditos dos bens e serviços essenciais à atividade produtiva. Mais alinhada à posição defendida pelos contribuintes, a decisão que definiu o conceito de insumos tem impacto fiscal estimado pela União em R$ 50 bilhões somente em 2015, segundo informações que constam na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019.
A 1ª Seção concluiu o julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.221.170 em fevereiro deste ano por maioria de cinco votos a três. Os ministros estabeleceram a tese de que o conceito de insumo se define pelos critérios da essencialidade e da relevância – ou seja, a importância do item para o contribuinte realizar o processo produtivo e gerar receitas.
A decisão afastou instruções normativas alinhadas com a interpretação mais restritiva da Receita Federal. Para permitir a tomada de crédito, o órgão exigia que o bem ou serviço considerado insumo fosse diretamente empregado e consumido no produto final.
Em novembro de 2018, a 1ª Seção também negou provimento aos embargos de declaração interpostos pela Fazenda Nacional. A União alegava que o conceito de insumos definido pelo STJ poderia ser usado, “numa interpretação superficial e desavisada”, para englobar despesas cujo creditamento é proibido por lei. Entretanto, os ministros entenderam que os argumentos trazidos nos embargos eram novos, não impugnados na fase de análise do recurso especial.
Em agosto de 2018, a 3ª Seção do STJ decidiu que é crime não recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações próprias, ainda que o tributo tenha sido declarado à fiscalização. Ao denegar o habeas corpus nº 399.109, os ministros entenderam que o contribuinte que deixar de pagar o ICMS próprio pode ser responsabilizado por apropriação indébita tributária, que consta no rol de crimes contra a ordem tributária. De acordo com a lei nº 8.137/1990, a pena é de seis meses a dois anos de prisão, com pagamento de multa.
Por maioria de seis votos a três, os ministros entenderam que pratica o crime o contribuinte que não pagar o ICMS, mesmo que tenha informado corretamente à fiscalização o valor devido aos cofres públicos estaduais. A defesa alegava, por outro lado, que a ação de declarar e não recolher o imposto caracterizaria apenas inadimplemento fiscal, e não crime.
Tal qual se dá com a apropriação indébita em geral, o fato de o agente registrar, apurar e declarar em guia própria ou em livros fiscais o imposto devido não tem o condão de elidir ou exercer nenhuma influência na prática do delito, visto que este não pressupõe a clandestinidade
A Corte Especial decidiu, em dezembro de 2018, que o rol do artigo 1.015 do Código de Processo Civil de 2015 tem taxatividade mitigada e admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada urgência. Isso significa que são permitidas outras hipóteses de admissão do recurso que não estão enumeradas no artigo. Desde agosto a Corte buscava definir a natureza do artigo 1.015, que trata das situações nas quais é possível às partes de um processo propor agravo de instrumento.
Por um placar apertado – sete votos a cinco – venceu o entendimento da relatora do recurso repetitivo, ministra Nancy Andrighi. “O rol do artigo 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”, diz a tese.
Segundo a relatora, “a taxatividade do artigo 1.015 é incapaz de tutelar adequadamente todas as questões em que pronunciamentos judiciais poderão causar sérios prejuízos e que, por isso, deverão ser imediatamente reexaminadas pelo segundo grau de jurisdição”. A ideia, de acordo com Andrighi, é “possibilitar a recorribilidade imediata de decisões interlocutórias fora da lista do art. 1.015 do CPC, sempre em caráter excepcional e desde que preenchido o requisito urgência”. Para a ministra, o uso da interpretação extensiva ou analógica dos incisos do artigo 1.015 do CPC não são suficientes para dar conta de todas as situações.
Em decisão de 8 de agosto de 2018, a 3ª Seção – quase por unanimidade – indeferiu o Incidente de Deslocamento de Competência 14, em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedia a transferência da Justiça estadual do Espírito Santo para a Justiça Federal a apuração de condutas e eventual responsabilização dos oficiais da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo envolvidos em uma greve ocorrida em 2017.
Segundo a PGR, a greve acarretou grave violação de direitos humanos prevista em tratado internacional do qual o Brasil é signatário e apresentou um risco de responsabilização internacional do Estado brasileiro em razão incapacidade das instâncias locais em investigar de forma isenta e efetiva dos fatos.
Para a 3ª Seção, porém, o IDC possui natureza processual, com características de excepcionalidade e subsidiariedade. Na decisão do STJ, em que ficou vencido apenas o ministro Ribeiro Dantas, a inércia das instâncias locais e o risco de responsabilização internacional são requisitos correlacionados – este pressupõe aquele – a serem justificados sob critérios objetivamente aferíveis.
Segundo a ministra Maria Thereza de Assis Moura, autora do voto vencedor, “ausente prova de leniência, inércia ou falta de comprometimento das instâncias locais em processar e julgar os crimes militares próprios objeto do IDC, inviável se cogitar sobre o risco de responsabilização internacional do Estado brasileiro”. “A incapacidade das instâncias locais em realizar uma persecução penal efetiva sobre os fatos deve ser justificada sob critérios objetivamente palpáveis”, disse.
Ainda de acordo com Maria Thereza, “o deslocamento não aparelha busca conveniente por uma melhor jurisdição, mas a transferência necessária de uma jurisdição inerte, ineficaz, para uma outra potencialmente capaz de acautelar a responsabilização do Estado brasileiro no plano internacional”.
A PGR recorreu da decisão do STJ e apresentou um recurso extraordinário para ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O recurso extraordinário foi admitido pelo presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha. A PGR sustenta que há repercussão geral da questão e aponta violação direta ao artigo 109, § 5º, da Constituição Federal, pela possibilidade de responsabilização internacional do Brasil diante do “elevado risco de contaminação do aparato estadual para a apuração do ocorrido”. O RE 1181371 foi protocolado no STF no último dia 10/12.
A 3ª Turma interpretou de forma ampla o artigo 304 do Código de Processo Civil de 2015 e entendeu que outras formas de impugnação, como a contestação, servem para impedir a estabilização da tutela antecipada. A questão foi discutida no recurso especial 1.760.966/SP e decidida em dezembro de 2018.
No caso, a controvérsia estava em saber se o juiz de primeiro grau, após analisar as razões apresentadas na contestação, poderia reconsiderar a decisão que havia deferido o pedido de tutela antecipada requerida em caráter antecedente, nos termos dos artigos 303 e 304 do CPC de 2015, a despeito da ausência de interposição de recurso pela parte no momento oportuno.
“É de se observar que, embora o caput do artigo 304 do CPC de 2015 determine que ‘a tutela antecipada, concedida nos termos do artigo 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso’, a leitura que deve ser feita do dispositivo legal é que a estabilização somente ocorrerá se não houver qualquer tipo de impugnação pela parte contrária”, apontou o relator do caso, Marco Aurélio Bellizze.
Para o ministro, o artigo 304 do CPC de 2015 disse “menos do que pretendia dizer”, razão pela qual “a interpretação extensiva mostra-se mais adequada ao instituto, notadamente em virtude da finalidade buscada com a estabilização da tutela antecipada”.
“Nessa perspectiva, caso a parte não interponha o recurso de agravo de instrumento contra a decisão que defere a tutela antecipada requerida em caráter antecedente, mas, por exemplo, se antecipa e apresenta contestação refutando os argumentos trazidos na inicial e pleiteando a improcedência do pedido, evidentemente não ocorrerá a estabilização da tutela”, entendeu.
Segundo Bellizze, não é possível que ocorra estabilização quando há recurso. Caso contrário, haveria um estímulo à interposição de agravos de instrumento, sobrecarregando os tribunais. “Da mesma forma, tal situação também acarretaria um estímulo desnecessário no ajuizamento da ação autônoma, prevista no artigo 304, a fim de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada”, argumentou.
A 4ª Turma definiu, em junho de 2018, que é possível regulamentar judicialmente o direito de visitas ao animal que pertencia a um casal. A decisão foi inédita e garantiu a um dos ex-cônjuges o direito de visitar o animal de estimação que um dia foi dos dois. Com o entendimento, o STJ manteve as visitas regulamentadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e permitiu que as duas pessoas participem da criação do pet.
No caso, um homem foi à Justiça pedir para que continuasse vendo a cadelinha adquirida durante união estável. Com a separação, o bichinho ficou com a ex-companheira. A decisão do STJ não chegou a equiparar a guarda de animal de estimação à guarda de filhos. Conforme o entendimento dos ministros, caberá ao juiz de primeira instância regular a forma de visitação.
Para o relator do caso no STJ, ministro Luís Felipe Salomão, a ideia por trás da decisão é garantir que “não se está frente a uma coisa inanimada”, sem, no entanto, estender aos animais de estimação a condição de “sujeito de direito”. “Reconhece-se, assim, um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos, voltado para a proteção do ser humano, e seu vínculo afetivo com o animal”, apontou o relator.
“Os tribunais do país têm se deparado com situações desse jaez, com divórcios e dissoluções de relações afetivas de casais em que a única divergência está justamente na definição da custódia do animal”, afirmou Salomão em seu voto. A discussão se deu no recurso especial nº 1.713.167/SP.
Em decisão inédita, o STJ responsabilizou a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) – responsável pela gestão dos trens da capital paulista e da região metropolitana – pelo assédio sexual sofrido por uma passageira dentro de um dos vagões do transporte coletivo.
A agressão ocorreu em 2014, quando a vítima embarcou na estação Guaianazes, pertencente à linha 11. A decisão é de maio de 2018. A CPTM foi condenada a indenizar a mulher em R$ 20 mil. Ela foi importunada por um homem que esfregou o pênis em suas nádegas enquanto ela tentava se locomover. Ao se queixar com o agressor, a vítima foi hostilizada pelos demais passageiros do trem, que a chamaram de “sapatão”. O assediador era um menor de 16 anos, que chegou a ser detido pela equipe da CPTM.
A decisão da 3ª Turma do STJ representa uma guinada na jurisprudência do tribunal. Há anos a Corte vem decidindo que o transportador não responde pelos danos sofridos pelos passageiros seja em virtude do arremesso de pedras contra o ônibus, ou em razão de assalto a mão armada no interior do coletivo, por exemplo.
Mas no caso do assédio sexual, a maioria dos ministros entendeu que o dano – mesmo praticado por terceiro – tem conexão com as atividades prestadas pela transportadora, que deveria zelar para que seus passageiros fossem levados de maneira incólume até o local de destino.
“O ciclo histórico que estamos presenciando exige um passo firme e corajoso. É papel do julgador, sempre com olhar cuidadoso, tratar do abalo psíquico ocorrido em decorrência da prestação de transporte. Não pode o ministro assumir uma postura comodista, e deve questionar a jurisprudência”, afirmou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.
A CPTM “nada mais fez para evitar que esses fatos ocorram, para reduzir a incidência desses eventos ultrajantes, como a disponibilização de mais vagões”, apontou a relatora. De acordo com ela, entre janeiro e dezembro de 2017 houve um aumento de 35% com relação ao mesmo período de 2016 no número de assédios registrados apenas na estação Guaianazes.
“A prestação do serviço de transporte de passageiros vem propiciando eventos de assédio sexual”, denunciou Andrighi. “Não se pode deixar de ouvir o grito por socorro das mulheres, vítimas dessa prática odiosa que é o assédio.”
O caso foi julgado no recurso especial nº 1.662.551/ SP.
A Corte Especial decidiu em 2018 não admitir agravo em recurso especial que não rebata todos os fundamentos da decisão. O chamado agravo em recurso especial é usado para demonstrar o motivo pelo qual está errada a decisão que negou seguimento ao recurso especial. Ele serve para submeter a questão ao STJ.
Os ministros julgaram, em conjunto, os Embargos de Divergência nos Agravos em Recurso Especial (EAREsp) 701.404, 746.775 e 831.326. Os recursos tratavam da necessidade de impugnação específica, em agravo, de todos os fundamentos da decisão que inadmite recurso especial.
Na Corte Especial, o entendimento fixado foi de que a decisão agravada não pode ser dividida e, portanto, deve ser impugnada em sua integralidade. Ou seja, a parte deve fazer a impugnação específica de todos os argumentos. A partir de agora, para que o recurso seja admitido, a defesa deverá rebater todos os pontos da decisão e não apenas da parte que busca a reforma de entendimento no tribunal.
Em quase quatro horas de julgamento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou a disputa de 123 anos entre a família imperial brasileira e a União sobre o Palácio Isabel, hoje Palácio Guanabara, sede do governo do estado Rio de Janeiro. Por unanimidade, a Corte entendeu que a posse e a propriedade do edifício é da União.
O processo, que chegou ao Judiciário em 1895, é considerado o mais antigo, ainda em tramitação, do Brasil. Todos os ministros da Turma seguiram o voto do relator, Antonio Carlos Ferreira, para quem o palácio, que serviu de moradia para a princesa e seu marido, o Conde d’Eu, teve origem em recursos do tesouro nacional.
O relator não viu “caracterizada concessão aos ilustres descendentes a qualquer direito de propriedade”, já que normas infraconstitucionais do império consideravam o palácio um “próprio nacional residencial”, destinado somente à habitação do Conde e da Condessa d’Eu.
A decisão do STJ mantém acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), que reconheceu que a família real possuía o domínio para uso e habitação, mas que a propriedade sempre foi do Estado.
Os Recursos Especiais 1.149.487 e 1.141.490 discutiam se o Palácio da Guanabara, no Rio de Janeiro, estava incluído, quando da proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, entre os bens privados da família imperial, ou, se era bem público destinado apenas à moradia, que teria perdido essa finalidade com o fim da monarquia no Brasil.
*Edição IGSA
*Fonte de pesquisa: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/retrospectiva-stj-julgamentos-2018-26122018
Por: Retrospectiva STJ: os principais julgamentos de 2018, .
O ano de 2018 no Superior Tribunal de Justiça (STJ) teve espaço para a resolução de um conflitos centenários, como a briga de mais de 123 anos entre a União e a Família Real brasileira pela posse do Palácio Guanabara, e contemporâneos, como a regulamentação da guarda compartilhada de animais de estimação.
Na Corte Especial, houve a decisão que restringiu o foro privilegiado para governadores e conselheiros de tribunais de contas aos casos relativos ao cargo. Com relação aos desembargadores o foro, também por decisão da Corte Especial, permaneceu no STJ.
Em matéria processual, a Corte Especial fez leituras do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15) e pacificou temas que vinham gerando dúvidas. É o caso, por exemplo, do julgamento sobre o agravo em recurso especial que não rebate todos os fundamentos da decisão. Ou da definição sobre a taxatividade mitigada do rol do artigo 1.015 do CPC/15.
Já em matéria criminal, o tribunal mudou sua jurisprudência e passou a considerar que a condenação prévia por porte de drogas para uso pessoal não serve para gerar agravante de reincidência.
Na intersecção da esfera penal com a tributária, o STJ decidiu que é crime não recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) próprio, ainda que declarado.
Em outro julgamento aguardado tanto pela Fazenda e quanto pelos contribuintes, a Corte definiu que o critério da essencialidade e da relevância determina o conceito de insumos para permitir créditos de PIS e Cofins – decisão cujo impacto fiscal é estimado em R$ 50 bilhões.
Leia, a seguir, seleção dos principais julgamentos do STJ em 2018.
Em junho de 2018, a Corte Especial decidiu limitar a prerrogativa de foro para governadores e conselheiros de tribunais de contas aos casos relacionados ao mandato e em função do cargo. Os ministros concluíram pela restrição após decisão do STF que, em maio, restringiu a prerrogativa de foro para deputados e senadores para crimes relacionados ao cargo e durante o mandato.
Com a decisão da Corte Superior, os processos envolvendo governadores ou conselheiros que não tiverem relação com os cargos serão baixados para primeira instância. Só ficarão no tribunal os casos que estiverem em fase de alegações finais, perto de serem concluídos.
A restrição da prerrogativa de foro começou a ser debatida no STJ por meio de uma denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o conselheiro do Tribunal de Contas do Distrito Federal Márcio Michel Alves de Oliveira pelo crime de fraude no pagamento por cheque. Como resultado, os autos foram baixados para a primeira instância.
Com relação aos governadores, a questão foi definida na Ação Penal 866, que envolvia o governador da Paraíba Ricardo Coutinho (PSB). No caso, o governador paraibano Ricardo Coutinho é investigado pela suposta prática de 12 crimes de responsabilidade cometidos enquanto era prefeito de João Pessoa, em 2010. Os ministros consideraram que os delitos não têm relação com o exercício do cargo de governador e mandaram o processo para o Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB).
Ao contrário do que aconteceu com os governadores e conselheiros de tribunais de contas, os desembargadores que cometerem crimes comuns e de responsabilidade, mesmo que não tenham sido praticados em razão do cargo, continuarão sendo julgados pelo STJ. A Corte Especial seguiu o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, para quem o foro especial tem por finalidade também resguardar a imparcialidade necessária ao julgamento, uma vez que evita o conflito de interesses entre magistrados vinculados ao mesmo tribunal.
Além dos desembargadores, a decisão contempla todos os crimes cometidos por juízes de segundo grau dos TRFs, TRTs e TREs. De acordo com a Corte Especial, o foro de desembargadores no STJ será aplicado sempre que um desembargador acusado da prática de crime sem relação com o exercício do cargo vier a ser julgado por juiz de primeiro grau vinculado ao mesmo tribunal que ele.
A manutenção do foro privilegiado foi decidida em uma questão de ordem no julgamento de uma ação penal — APn 878 — envolvendo o desembargador Luís César de Paula Espíndola, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, acusado de lesão corporal contra a mãe e a irmã.
No início da discussão, ainda em agosto de 2018, Gonçalves apontou que “ser julgado por juiz com duvidosa condição de se posicionar de forma imparcial, afinal, violaria a pretensão de realização de justiça criminal de forma isonômica e republicana”.
Em uma guinada jurisprudencial, o STJ passou a considerar em 2018 que a condenação prévia por porte de droga para consumo próprio, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas, não deve constituir causa geradora de reincidência. As decisões vieram tanto da 5ª quanto da 6ª Turma – colegiados que compõem a 3ª Seção.
No Recurso Especial 1.672.654/SP, julgado em agosto pela 6ª Turma, a ministra Maria Thereza de Assis Moura considerou ser “inequivocamente desproporcional” a consideração para fins de reincidência, tendo em vista que a posse, embora seja crime, é punida com medidas de natureza extrapenal.
Para a ministra, “em face dos questionamentos acerca da proporcionalidade do direito penal para o controle do consumo de drogas em prejuízo de outras medidas de natureza extrapenal relacionadas às políticas de redução de danos, eventualmente até mais severas para a contenção do consumo do que aquelas previstas atualmente, o prévio apenamento por porte de droga para consumo próprio, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas, não deve constituir causa geradora de reincidência”.
No Habeas Corpus 453.437/SP, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, “mostra-se desproporcional o delito do artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade”. O caso foi analisado pela 5ª Turma em outubro.
Tendo em vista que a reincidência foi o único fundamento para não aplicar a diminuição da pena no caso que estava sendo julgado, Fonseca aplicou a redutora. É que, para a aplicação da causa de diminuição de pena do artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais: ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa.
Neste que é considerado o julgamento de 2018 na área tributária tanto por representantes da Fazenda quanto dos contribuintes, a 1ª Seção do STJ determinou que, no regime não-cumulativo do PIS e da Cofins, as empresas podem tomar créditos dos bens e serviços essenciais à atividade produtiva. Mais alinhada à posição defendida pelos contribuintes, a decisão que definiu o conceito de insumos tem impacto fiscal estimado pela União em R$ 50 bilhões somente em 2015, segundo informações que constam na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019.
A 1ª Seção concluiu o julgamento do recurso especial repetitivo nº 1.221.170 em fevereiro deste ano por maioria de cinco votos a três. Os ministros estabeleceram a tese de que o conceito de insumo se define pelos critérios da essencialidade e da relevância – ou seja, a importância do item para o contribuinte realizar o processo produtivo e gerar receitas.
A decisão afastou instruções normativas alinhadas com a interpretação mais restritiva da Receita Federal. Para permitir a tomada de crédito, o órgão exigia que o bem ou serviço considerado insumo fosse diretamente empregado e consumido no produto final.
Em novembro de 2018, a 1ª Seção também negou provimento aos embargos de declaração interpostos pela Fazenda Nacional. A União alegava que o conceito de insumos definido pelo STJ poderia ser usado, “numa interpretação superficial e desavisada”, para englobar despesas cujo creditamento é proibido por lei. Entretanto, os ministros entenderam que os argumentos trazidos nos embargos eram novos, não impugnados na fase de análise do recurso especial.
Em agosto de 2018, a 3ª Seção do STJ decidiu que é crime não recolher o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações próprias, ainda que o tributo tenha sido declarado à fiscalização. Ao denegar o habeas corpus nº 399.109, os ministros entenderam que o contribuinte que deixar de pagar o ICMS próprio pode ser responsabilizado por apropriação indébita tributária, que consta no rol de crimes contra a ordem tributária. De acordo com a lei nº 8.137/1990, a pena é de seis meses a dois anos de prisão, com pagamento de multa.
Por maioria de seis votos a três, os ministros entenderam que pratica o crime o contribuinte que não pagar o ICMS, mesmo que tenha informado corretamente à fiscalização o valor devido aos cofres públicos estaduais. A defesa alegava, por outro lado, que a ação de declarar e não recolher o imposto caracterizaria apenas inadimplemento fiscal, e não crime.
Tal qual se dá com a apropriação indébita em geral, o fato de o agente registrar, apurar e declarar em guia própria ou em livros fiscais o imposto devido não tem o condão de elidir ou exercer nenhuma influência na prática do delito, visto que este não pressupõe a clandestinidade
A Corte Especial decidiu, em dezembro de 2018, que o rol do artigo 1.015 do Código de Processo Civil de 2015 tem taxatividade mitigada e admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada urgência. Isso significa que são permitidas outras hipóteses de admissão do recurso que não estão enumeradas no artigo. Desde agosto a Corte buscava definir a natureza do artigo 1.015, que trata das situações nas quais é possível às partes de um processo propor agravo de instrumento.
Por um placar apertado – sete votos a cinco – venceu o entendimento da relatora do recurso repetitivo, ministra Nancy Andrighi. “O rol do artigo 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”, diz a tese.
Segundo a relatora, “a taxatividade do artigo 1.015 é incapaz de tutelar adequadamente todas as questões em que pronunciamentos judiciais poderão causar sérios prejuízos e que, por isso, deverão ser imediatamente reexaminadas pelo segundo grau de jurisdição”. A ideia, de acordo com Andrighi, é “possibilitar a recorribilidade imediata de decisões interlocutórias fora da lista do art. 1.015 do CPC, sempre em caráter excepcional e desde que preenchido o requisito urgência”. Para a ministra, o uso da interpretação extensiva ou analógica dos incisos do artigo 1.015 do CPC não são suficientes para dar conta de todas as situações.
Em decisão de 8 de agosto de 2018, a 3ª Seção – quase por unanimidade – indeferiu o Incidente de Deslocamento de Competência 14, em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedia a transferência da Justiça estadual do Espírito Santo para a Justiça Federal a apuração de condutas e eventual responsabilização dos oficiais da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo envolvidos em uma greve ocorrida em 2017.
Segundo a PGR, a greve acarretou grave violação de direitos humanos prevista em tratado internacional do qual o Brasil é signatário e apresentou um risco de responsabilização internacional do Estado brasileiro em razão incapacidade das instâncias locais em investigar de forma isenta e efetiva dos fatos.
Para a 3ª Seção, porém, o IDC possui natureza processual, com características de excepcionalidade e subsidiariedade. Na decisão do STJ, em que ficou vencido apenas o ministro Ribeiro Dantas, a inércia das instâncias locais e o risco de responsabilização internacional são requisitos correlacionados – este pressupõe aquele – a serem justificados sob critérios objetivamente aferíveis.
Segundo a ministra Maria Thereza de Assis Moura, autora do voto vencedor, “ausente prova de leniência, inércia ou falta de comprometimento das instâncias locais em processar e julgar os crimes militares próprios objeto do IDC, inviável se cogitar sobre o risco de responsabilização internacional do Estado brasileiro”. “A incapacidade das instâncias locais em realizar uma persecução penal efetiva sobre os fatos deve ser justificada sob critérios objetivamente palpáveis”, disse.
Ainda de acordo com Maria Thereza, “o deslocamento não aparelha busca conveniente por uma melhor jurisdição, mas a transferência necessária de uma jurisdição inerte, ineficaz, para uma outra potencialmente capaz de acautelar a responsabilização do Estado brasileiro no plano internacional”.
A PGR recorreu da decisão do STJ e apresentou um recurso extraordinário para ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O recurso extraordinário foi admitido pelo presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha. A PGR sustenta que há repercussão geral da questão e aponta violação direta ao artigo 109, § 5º, da Constituição Federal, pela possibilidade de responsabilização internacional do Brasil diante do “elevado risco de contaminação do aparato estadual para a apuração do ocorrido”. O RE 1181371 foi protocolado no STF no último dia 10/12.
A 3ª Turma interpretou de forma ampla o artigo 304 do Código de Processo Civil de 2015 e entendeu que outras formas de impugnação, como a contestação, servem para impedir a estabilização da tutela antecipada. A questão foi discutida no recurso especial 1.760.966/SP e decidida em dezembro de 2018.
No caso, a controvérsia estava em saber se o juiz de primeiro grau, após analisar as razões apresentadas na contestação, poderia reconsiderar a decisão que havia deferido o pedido de tutela antecipada requerida em caráter antecedente, nos termos dos artigos 303 e 304 do CPC de 2015, a despeito da ausência de interposição de recurso pela parte no momento oportuno.
“É de se observar que, embora o caput do artigo 304 do CPC de 2015 determine que ‘a tutela antecipada, concedida nos termos do artigo 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso’, a leitura que deve ser feita do dispositivo legal é que a estabilização somente ocorrerá se não houver qualquer tipo de impugnação pela parte contrária”, apontou o relator do caso, Marco Aurélio Bellizze.
Para o ministro, o artigo 304 do CPC de 2015 disse “menos do que pretendia dizer”, razão pela qual “a interpretação extensiva mostra-se mais adequada ao instituto, notadamente em virtude da finalidade buscada com a estabilização da tutela antecipada”.
“Nessa perspectiva, caso a parte não interponha o recurso de agravo de instrumento contra a decisão que defere a tutela antecipada requerida em caráter antecedente, mas, por exemplo, se antecipa e apresenta contestação refutando os argumentos trazidos na inicial e pleiteando a improcedência do pedido, evidentemente não ocorrerá a estabilização da tutela”, entendeu.
Segundo Bellizze, não é possível que ocorra estabilização quando há recurso. Caso contrário, haveria um estímulo à interposição de agravos de instrumento, sobrecarregando os tribunais. “Da mesma forma, tal situação também acarretaria um estímulo desnecessário no ajuizamento da ação autônoma, prevista no artigo 304, a fim de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada”, argumentou.
A 4ª Turma definiu, em junho de 2018, que é possível regulamentar judicialmente o direito de visitas ao animal que pertencia a um casal. A decisão foi inédita e garantiu a um dos ex-cônjuges o direito de visitar o animal de estimação que um dia foi dos dois. Com o entendimento, o STJ manteve as visitas regulamentadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo e permitiu que as duas pessoas participem da criação do pet.
No caso, um homem foi à Justiça pedir para que continuasse vendo a cadelinha adquirida durante união estável. Com a separação, o bichinho ficou com a ex-companheira. A decisão do STJ não chegou a equiparar a guarda de animal de estimação à guarda de filhos. Conforme o entendimento dos ministros, caberá ao juiz de primeira instância regular a forma de visitação.
Para o relator do caso no STJ, ministro Luís Felipe Salomão, a ideia por trás da decisão é garantir que “não se está frente a uma coisa inanimada”, sem, no entanto, estender aos animais de estimação a condição de “sujeito de direito”. “Reconhece-se, assim, um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos, voltado para a proteção do ser humano, e seu vínculo afetivo com o animal”, apontou o relator.
“Os tribunais do país têm se deparado com situações desse jaez, com divórcios e dissoluções de relações afetivas de casais em que a única divergência está justamente na definição da custódia do animal”, afirmou Salomão em seu voto. A discussão se deu no recurso especial nº 1.713.167/SP.
Em decisão inédita, o STJ responsabilizou a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) – responsável pela gestão dos trens da capital paulista e da região metropolitana – pelo assédio sexual sofrido por uma passageira dentro de um dos vagões do transporte coletivo.
A agressão ocorreu em 2014, quando a vítima embarcou na estação Guaianazes, pertencente à linha 11. A decisão é de maio de 2018. A CPTM foi condenada a indenizar a mulher em R$ 20 mil. Ela foi importunada por um homem que esfregou o pênis em suas nádegas enquanto ela tentava se locomover. Ao se queixar com o agressor, a vítima foi hostilizada pelos demais passageiros do trem, que a chamaram de “sapatão”. O assediador era um menor de 16 anos, que chegou a ser detido pela equipe da CPTM.
A decisão da 3ª Turma do STJ representa uma guinada na jurisprudência do tribunal. Há anos a Corte vem decidindo que o transportador não responde pelos danos sofridos pelos passageiros seja em virtude do arremesso de pedras contra o ônibus, ou em razão de assalto a mão armada no interior do coletivo, por exemplo.
Mas no caso do assédio sexual, a maioria dos ministros entendeu que o dano – mesmo praticado por terceiro – tem conexão com as atividades prestadas pela transportadora, que deveria zelar para que seus passageiros fossem levados de maneira incólume até o local de destino.
“O ciclo histórico que estamos presenciando exige um passo firme e corajoso. É papel do julgador, sempre com olhar cuidadoso, tratar do abalo psíquico ocorrido em decorrência da prestação de transporte. Não pode o ministro assumir uma postura comodista, e deve questionar a jurisprudência”, afirmou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.
A CPTM “nada mais fez para evitar que esses fatos ocorram, para reduzir a incidência desses eventos ultrajantes, como a disponibilização de mais vagões”, apontou a relatora. De acordo com ela, entre janeiro e dezembro de 2017 houve um aumento de 35% com relação ao mesmo período de 2016 no número de assédios registrados apenas na estação Guaianazes.
“A prestação do serviço de transporte de passageiros vem propiciando eventos de assédio sexual”, denunciou Andrighi. “Não se pode deixar de ouvir o grito por socorro das mulheres, vítimas dessa prática odiosa que é o assédio.”
O caso foi julgado no recurso especial nº 1.662.551/ SP.
A Corte Especial decidiu em 2018 não admitir agravo em recurso especial que não rebata todos os fundamentos da decisão. O chamado agravo em recurso especial é usado para demonstrar o motivo pelo qual está errada a decisão que negou seguimento ao recurso especial. Ele serve para submeter a questão ao STJ.
Os ministros julgaram, em conjunto, os Embargos de Divergência nos Agravos em Recurso Especial (EAREsp) 701.404, 746.775 e 831.326. Os recursos tratavam da necessidade de impugnação específica, em agravo, de todos os fundamentos da decisão que inadmite recurso especial.
Na Corte Especial, o entendimento fixado foi de que a decisão agravada não pode ser dividida e, portanto, deve ser impugnada em sua integralidade. Ou seja, a parte deve fazer a impugnação específica de todos os argumentos. A partir de agora, para que o recurso seja admitido, a defesa deverá rebater todos os pontos da decisão e não apenas da parte que busca a reforma de entendimento no tribunal.
Em quase quatro horas de julgamento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou a disputa de 123 anos entre a família imperial brasileira e a União sobre o Palácio Isabel, hoje Palácio Guanabara, sede do governo do estado Rio de Janeiro. Por unanimidade, a Corte entendeu que a posse e a propriedade do edifício é da União.
O processo, que chegou ao Judiciário em 1895, é considerado o mais antigo, ainda em tramitação, do Brasil. Todos os ministros da Turma seguiram o voto do relator, Antonio Carlos Ferreira, para quem o palácio, que serviu de moradia para a princesa e seu marido, o Conde d’Eu, teve origem em recursos do tesouro nacional.
O relator não viu “caracterizada concessão aos ilustres descendentes a qualquer direito de propriedade”, já que normas infraconstitucionais do império consideravam o palácio um “próprio nacional residencial”, destinado somente à habitação do Conde e da Condessa d’Eu.
A decisão do STJ mantém acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), que reconheceu que a família real possuía o domínio para uso e habitação, mas que a propriedade sempre foi do Estado.
Os Recursos Especiais 1.149.487 e 1.141.490 discutiam se o Palácio da Guanabara, no Rio de Janeiro, estava incluído, quando da proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, entre os bens privados da família imperial, ou, se era bem público destinado apenas à moradia, que teria perdido essa finalidade com o fim da monarquia no Brasil.
*Edição IGSA
*Fonte de pesquisa: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/retrospectiva-stj-julgamentos-2018-26122018