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STJ decide que, na recuperação de grupo econômico, cada sociedade deve comprovar funcionamento por mais de dois anos

Para pedir a recuperação judicial em litisconsórcio ativo, cada sociedade empresária integrante de grupo econômico deve comprovar individualmente o funcionamento por mais de dois anos, como exige o artigo 48 da Lei de Falências. A interpretação foi dada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar controvérsia relacionada à recuperação requerida por três empresas de um mesmo grupo.

Em primeira instância, o juízo da recuperação deferiu o pedido para duas das empresas e o negou para a outra, por entender que esta última não contava com o mínimo de dois anos de constituição – o que seria um impedimento legal.

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que, em se tratando de grupo econômico, cada uma das empresas deve demonstrar o cumprimento do requisito temporal de dois anos, “pois elas conservam a sua individualidade e, por conseguinte, apresentam a personalidade jurídica distinta das demais integrantes da referida coletividade”.

Lacuna legal

Segundo o ministro, a Lei de Falências não disciplina a possibilidade de apresentação conjunta do pedido de recuperação judicial por sociedades que integram determinado grupo econômico e, portanto, não trata da formação de litisconsórcio ativo nessas hipóteses.

No entanto, a própria Lei de Falências, no artigo 189, prevê a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil aos processos de recuperação e falência, havendo ainda outros dispositivos que remetem à utilização do procedimento ordinário normatizado no CPC.

“Nesse contexto, vários doutrinadores sustentam a possibilidade de o pedido de soerguimento ser formulado por grupo econômico, haja vista as normas a respeito do litisconsórcio inseridas no CPC não se revelarem, a seu turno, incompatíveis com o processo recuperacional e falimentar”, explicou o ministro.

União de esforços

De acordo com Villas Bôas Cueva, a utilidade do litisconsórcio ativo na recuperação fica clara quando se leva em conta que as organizações empresariais plurissocietárias são “caracterizadas por entrelaçamentos contratuais com responsabilidades cruzadas, decorrentes, em tese, da necessidade de união de esforços com o propósito de obter maior lucro, de reduzir custos e de aumentar a participação em um mercado cada vez mais complexo e competitivo”.

O relator explicou que a admissão do litisconsórcio ativo na recuperação judicial obedece a dois conjuntos de fatores: a interdependência das relações societárias formadas nos grupos econômicos e a necessidade de superar simultaneamente o quadro de instabilidade econômico-financeira; e a autorização da legislação processual civil para as partes litigarem conjuntamente no mesmo processo, não havendo colisão com os princípios e fundamentos da Lei de Falências.

Situação peculiar

Villas Bôas Cueva observou que o prazo de dois anos previsto no artigo 48 da Lei de Falências tem como objetivo principal restringir a concessão da recuperação a sociedades empresárias que se achem consolidadas no mercado e apresentem certo grau de viabilidade econômico-financeira, capaz de justificar o sacrifício imposto aos credores.

No caso analisado pela Terceira Turma, uma das sociedades integrantes do grupo era resultante da cisão parcial de outra e não cumpria a exigência de mais de dois anos de constituição para ter direito à recuperação, razão pela qual o juiz indeferiu seu pedido em primeira instância.

Ao examinar as peculiaridades do caso, o colegiado, seguindo de forma unânime o voto do relator, afastou a rigidez do entendimento sobre o artigo 48 para permitir a recuperação também à empresa resultante da cisão.

Sucessão

Para o ministro, é incontroverso que a nova sociedade não havia cumprido o prazo de dois anos de exercício regular da atividade empresarial, “circunstância que a afastaria, em tese, da possibilidade de requerer a recuperação judicial”.

No entanto, a empresa da qual se originou a nova sociedade operava regularmente havia mais de dois anos. No processo de cisão, foram transferidas para a nova empresa diversas lojas, quase todas constituídas também há mais de dois anos.

Na visão do ministro, a empresa cuja recuperação foi indeferida sucedeu integralmente em direitos e obrigações outras sociedades que contavam com período de funcionamento regular superior ao exigido pela Lei de Falências, ou seja, tanto a sociedade cedente quanto as lojas que passaram ao comando da nova empresa cumpriram o biênio legal.

“É válido ressaltar que a cisão não ocasionou alteração do objeto social, tampouco a interrupção das atividades empresariais, tanto da sociedade cedente quanto da cindida”, concluiu o relator.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.665.042 – RS (2017/0074227-5)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : VOLPATO ADMINISTRACAO E PARTICIPACOES S/A
RECORRENTE : LOJAS VOLPATO LTDA
RECORRENTE : REDE VAREJO BRASIL ELETRODOMESTICOS LTDA
ADVOGADOS : DARCIO VIEIRA MARQUES E OUTRO(S) – RS003806
GIOVANI QUADROS ANDRIGHI – RS028682
RAFAEL BRIZOLA MARQUES – RS076787
RECORRIDO : BANCO BRADESCO S/A
ADVOGADOS : ELÓI CONTINI – RS035912
TADEU CERBARO E OUTRO(S) – RS038459
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. GRUPO ECONÔMICO. ART. 48 DA LRF.
ATIVIDADE REGULAR. DOIS ANOS. CISÃO EMPRESARIAL.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código
de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Cinge-se a controvérsia a definir se, em caso de recuperação judicial de grupo
econômico, todas as sociedades empresárias devem cumprir individualmente o
requisito temporal de 2 (dois) anos previsto no caput do art. 48 da Lei nº
11.101/2005.
3. É possível a formação de litisconsórcio ativo na recuperação judicial para
abranger as sociedades integrantes do mesmo grupo econômico.
4. As sociedades empresárias integrantes de grupo econômico devem
demonstrar individualmente o cumprimento do requisito temporal de 2 (dois) anos
de exercício regular de suas atividades para postular a recuperação judicial em
litisconsórcio ativo.
5. Na hipótese, a Rede Varejo Brasil Eletrodomésticos Ltda. – concebida após a
cisão de sociedade com mais de 2 (anos) de atividade empresarial regular – pode
integrar a recuperação judicial, considerando-se as diversas peculiaridades
retratadas nos autos.
6. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto
do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro
(Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Impedida a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília (DF), 25 de junho de 2019(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Relator

Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça

Por: STJ decide que, na recuperação de grupo econômico, cada sociedade deve comprovar funcionamento por mais de dois anos, .

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